Reflexão para o governo e o povo: planeamento urbano de díli com humanidade e justiça

(Domingos G. de Araújo, missionário em Portugal)

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G-NEWS (PORTUGAL) — A cidade de Díli, capital de Timor-Leste, é um símbolo da identidade nacional e o centro administrativo, económico e cultural do país. Como porta de entrada do Estado, a gestão urbana de Díli reflete o progresso e a visão de futuro de Timor-Leste. Contudo, nos últimos tempos, as medidas do governo para reordenar a cidade através de despejos e realojamentos têm gerado controvérsias. As comunidades afetadas sentem que os seus direitos foram ignorados, enquanto o governo enfrenta o dilema entre a necessidade de modernização e o respeito pelos direitos humanos.

-O Governo Está Errado?

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Em princípio, o governo tem legitimidade para gerir terrenos públicos em prol do interesse comum. O planeamento urbano faz parte de um esforço para melhorar a qualidade de vida, reforçar infraestruturas e criar um ambiente mais organizado. No entanto, uma boa política não se mede apenas pelos resultados finais, mas também pelo processo que a sustenta.

O governo será considerado errado se implementar políticas de despejo sem a devida preparação, sem comunicação clara e sem oferecer alternativas dignas às comunidades afetadas. Segundo o filósofo John Rawls, a justiça não é apenas uma questão de distribuir benefícios de forma equitativa, mas também de garantir um tratamento justo para os grupos mais vulneráveis. No caso de Díli, as comunidades que residem há décadas em determinadas áreas representam grupos vulneráveis que merecem atenção especial.

-A Importância da Comunicação e do Tempo Adequado

Uma das principais críticas às políticas de realojamento em Díli é a falta de comunicação prévia por parte do governo. Mesmo que as habitações afetadas estejam localizadas em terrenos do Estado, o governo tem a obrigação de informar os cidadãos antecipadamente. Este anúncio não deve ser apenas uma formalidade, mas um gesto de respeito pela dignidade humana.

A comunicação deve ser realizada de forma ampla e incluir todas as partes interessadas, como as comunidades afetadas, líderes locais e organizações civis. O tempo dado deve ser suficiente para que os cidadãos possam preparar-se. Em práticas internacionais, o período mínimo recomendado para notificação de despejo varia entre 3 a 6 meses, permitindo às pessoas encontrar soluções alternativas, sejam elas uma nova habitação ou planos de mudança organizados.

-Compensação: Direito ou Opção?

Para as comunidades que vivem há décadas em determinados locais, as suas casas não são apenas estruturas físicas, mas também parte da sua identidade e vida social. Muitas destas pessoas investiram recursos financeiros e emocionais para construir uma vida estável. Assim, o realojamento sem uma compensação adequada equivale a ignorar os seus direitos fundamentais.

A compensação é simultaneamente um dever moral e uma responsabilidade legal do governo para proteger os seus cidadãos.

Eis algumas formas de compensação que podem ser consideradas:

  1. Habitação Alternativa: O governo pode construir residências adequadas, equipadas com acesso a serviços públicos essenciais, como escolas, saúde e transporte.
  2. Compensação Financeira: Caso a construção de novas habitações demore, as famílias podem receber apoio financeiro para arrendar ou adquirir habitações temporárias.
  3. Apoio no Emprego e Formação: Para aqueles que perdem acesso aos seus meios de subsistência devido ao realojamento, o governo pode oferecer formação profissional ou criar oportunidades de emprego nas novas localidades.

Abordagem Humana na Política de Realojamento

Uma abordagem humana é fundamental para o sucesso das políticas de realojamento. Sem ela, o governo arrisca-se a perder a confiança dos cidadãos e a gerar conflitos sociais mais amplos. Algumas medidas que podem ser adotadas incluem:

  1. Diálogo e Participação

O governo deve abrir espaços de diálogo com as comunidades afetadas.

A consulta pública deve ser parte integrante do processo político, e não uma mera formalidade. Envolver as comunidades permitirá ao governo compreender as suas necessidades e preocupações, buscando soluções conjuntas.

  1. Respeito pelos Direitos Humanos

O realojamento deve ser realizado de forma a respeitar a dignidade humana.

A violência ou coerção só criarão traumas e agravarão a situação. Pelo contrário, uma abordagem empática e respeitosa fortalecerá a confiança nas instituições públicas.

  1. Transparência e Responsabilização

O governo deve explicar, de forma clara e transparente, as razões por trás das suas decisões.

É importante que os cidadãos entendam que estas medidas visam o bem comum, e não o benefício de grupos específicos. Além disso, é essencial garantir a supervisão rigorosa da implementação destas políticas para evitar abusos.

  1. Apoio Pós-Realojamento

Após a realocação, as comunidades não devem ser abandonadas.

O governo deve oferecer apoio contínuo para ajudar na adaptação às novas condições. Este apoio pode incluir serviços psicológicos, assistência administrativa ou formação para aquisição de novas competências.

-Uma Grande Visão: Planeamento Urbano para o Bem Comum

O planeamento urbano de Díli não é apenas um projeto de infraestrutura, mas também um reflexo da grande visão do governo para o futuro de Timor-Leste. Uma cidade organizada, moderna e inclusiva será um símbolo do progresso e motivo de orgulho nacional. Contudo, este progresso não deve ser alcançado à custa dos direitos das comunidades mais desfavorecidas.

Como afirmou Aristóteles, “A justiça consiste em dar a cada um o que lhe é devido.” Neste contexto, o direito das comunidades à dignidade deve ser sempre respeitado. O governo, como representante de toda a nação, deve garantir que as suas políticas reflitam o espírito de justiça e bem-estar coletivo.

-Reflexão para o Governo e a Sociedade

A situação em Díli é uma lição valiosa tanto para o governo como para os cidadãos de Timor-Leste. O governo precisa refletir sobre a forma como desenha e implementa as suas políticas, especialmente em relação à comunicação e ao respeito pelos direitos humanos. Por outro lado, os cidadãos devem compreender que o planeamento urbano é um passo essencial para construir um futuro melhor.

Com diálogo aberto, transparência e uma abordagem humana, é possível transformar o planeamento urbano de Díli num exemplo de sucesso de desenvolvimento justo. Governo e sociedade devem trabalhar juntos, de mãos dadas, para concretizar a visão de um Timor-Leste mais justo, próspero e digno para todos.

-Conclusão: Construir o Futuro Juntos

O planeamento urbano de Díli é parte integrante da longa jornada de Timor-Leste rumo ao progresso. Este passo deve ser dado com cautela, priorizando o diálogo e respeitando os direitos das comunidades.

O governo precisa demonstrar que é representante de todo o povo, e não apenas de uma minoria privilegiada. As comunidades afetadas também precisam ser tranquilizadas de que fazem parte do grande projeto nacional. Com uma abordagem inclusiva, transparente e humana, podemos construir Díli como uma cidade moderna e organizada, que reflita o espírito de justiça e solidariedade. Pois, no final, o verdadeiro progresso é aquele que beneficia a todos, sem exceções.

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